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A C&A obteve tutela antecipada (espécie de liminar) para deixar de recolher a multa adicional de 10% sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), paga em demissões sem justa causa. É o primeiro precedente que se tem notícia após a decisão do governo federal de manter a cobrança. Cabe recurso.
Depois de a presidente Dilma Rousseff vetar, em julho, o projeto de lei que acabava com a multa, alegando impacto anual de R$ 3 bilhões nas contas do FGTS, quatro confederações empresariais ajuizaram três ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) no Supremo Tribunal Federal (STF). Empresas também seguiram o mesmo caminho e questionam na Justiça a cobrança.
Os contribuintes alegam que a multa já teria cumprido o papel para o qual foi criada e que o governo a estaria utilizando para outros fins, como o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. Instituída pela Lei Complementar nº 110, de 2001, a multa visava recompor um déficit de R$ 40 bilhões no FGTS gerado com o pagamento dos expurgos inflacionários dos planos Verão e Collor I.
"Pelos balanços, identificamos que o FGTS é superavitário desde 2005. Em janeiro de 2007, foi paga a última parcela dos expurgos. Logo, não há mais necessidade de arrecadação", afirma Ricardo Martins Rodrigues, sócio do escritório Tudisco & Rodrigues Advogados, que ajuizou cinco mandados de segurança em São Paulo e Vitória, ainda sem decisões. Segundo o advogado, os R$ 4,2 bilhões provisionados em 2012 seriam de discussões judiciais de trabalhadores que discordaram dos valores recebidos.
Algumas companhias já procuraram escritórios de advocacia para entender as chances de vitória na disputa, mas preferiram aguardar o julgamento do Supremo. Outras optaram por entrar com ações individuais. O Ministério Público Federal já deu parecer favorável à tese de uma empresa de comércio exterior, cuja ação está em andamento na 5ª Vara Federal de São Paulo.
Na Justiça Federal em Brasília há três ações sobre o assunto. Um provedor de acesso à internet e uma fabricante de cimentos tiveram os pedidos de liminar negados. O mérito da questão ainda deverá ser analisado. A C&A, representada pelo Souza, Schneider, Pugliesi e Sztokfisz Advogados, obteve a primeira liminar favorável para deixar de recolher a multa.
Na decisão, proferida no dia 25, a juíza Solange Salgado, da 1ª Vara Federal de Brasília, concorda que foi cumprida a finalidade para a qual a contribuição foi instituída. "Tal justificativa permaneceu válida até o ano de 2007, uma vez que a última parcela dos complementos de correção monetária foi paga em janeiro daquele ano", diz na decisão.
Para fundamentar o argumento, a juíza cita o voto do ministro Joaquim Barbosa proferido em junho de 2012 no julgamento de duas Adins que questionaram a própria criação da multa adicional de 10% sobre o FGTS. Naquela ocasião, Barbosa afirmou que "a existência da contribuição somente se justifica se preservadas sua destinação e finalidade".
A mensagem de veto da presidente Dilma Rousseff ao projeto de lei que acabava com a cobrança também é citada pela magistrada para fundamentar sua decisão. "Há nítida intenção [da presidente da República] de eternizar a contribuição, enquanto não criada outra. Tanto que um dos argumentos do veto é a necessidade de adoção de medidas compensatórias, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal", afirma.
Na mensagem de veto e na manifestação apresentada ao Supremo, o governo alega que haverá perda de R$ 3 bilhões anuais na conta do FGTS com o fim da arrecadação, o que "impactaria fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida". Segundo a própria União, "mais da metade dos recursos" da multa são destinados aos subsídios do programa habitacional.
Em resposta às Adins propostas no STF, a União alega que a Lei Complementar nº 110 não fixou limite para a cobrança do adicional de 10%. "É insofismável que o prazo de vigência dessa contribuição é indefinido", diz no documento de 24 páginas o consultor da União, Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho.
Apesar de concordar que a multa destinou-se a cobrir o déficit do FGTS, a Advocacia-Geral da União (AGU) defende que a justificativa não foi incorporada ao texto da lei. "Não condiciona [a norma] o fim da exigibilidade do tributo a termo ou condição", afirma.
Para a assessora jurídica da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), Ana Paula Locoselli, "o governo admitiu que está errado" ao apresentar, no dia 17 de setembro, projeto de lei que altera a Lei Complementar nº 110 para transferir os recursos ao Minha Casa, Minha Vida. Pela proposta, o trabalhador demitido sem justa causa poderá resgatar o dinheiro quando se aposentar. A verba só poderá ser recuperada se ele não tiver adquirido imóvel pelo programa habitacional.
Procurada pelo Valor, a C&A informou que não comenta ações judiciais em andamento.
Fonte: Valor Econômico